terça-feira, 19 de maio de 2020

A CLOROQUINOLÂNDIA


A Cloroquinolândia:
Uma Paródia da Vida Real


(Texto publicado no Jornal Folha do Sudoeste, 23/05/2020)


O que é isso, minha gente!?!?!

O fanatismo agora surfa nas ondas bioquímicas...

... a tal Cloroquina virou ídolo; o Mito da Indústria Química Farmacêutica.

Essa "miracle drug" brasileira (???) descoberta por Hans Andersag, um austríaco, que trabalhava na Bayer, na Alemanha, virou o objeto de lateralidade da vez. Algo – assim como na política – do tipo que "se você não apoia" fervorosamente, você passa a ser inimigo declarado ... tipo um "Vai pra Cuba!", na versão química...

Andersag sintetizou a molécula em 1934... e esta "foi inicialmente rejeitada por ser muito tóxica", até 1945 (assim diz a história), quando, então, nos EUA e também na Austrália descobriram seu efeito contra o Plasmodium, o protozoário causador da Malária... e assim, dentre tudo que havia disponível na época – substâncias ainda mais tóxicas – passou a ser a única opção contra a malária...

Em 10 ou 11 anos de uso, começaram a surgir casos de cepas resistentes. Os EUA (que conta, contra o estado, com um processo movido por ex-combatentes da guerra no Vietnã), usava Cloroquina, profilaticamente, em seus soldados e perceberam rapidamente a crescente incidência de malária entre as tropas... e, posteriormente, seus efeitos adversos, dentre eles, psicose... (informações constantes nos arquivos históricos da Stanford University).

O mecanismo de ação desta droga se dá por reações metabólicas de ligação... se une à Porfirina, que por si só, em "acúmulo", pode levar a distúrbios neurológicos. Passa pelo metabolismo hepático e renal, podendo causar perda de função destes órgãos... até aí, tudo bem... de repente, é a única opção... mas isto pode levar a sérios distúrbios, como: retinopatias, problemas relacionados ao sistema hematopoiético e anemia hemolítica, miastenia, porfiria, surdez, psicose e outros transtornos neurológicos (Pois é... é exatamente o que os filmes hollywoodianos nos mostram: soldados com severos transtornos psíquicos ou “traumas de guerra”), enfim... Mas, de repente, é mesmo a única opção...

Agora, andam replicando, nas redes sociais, uma postagem totalmente descabida. O disparate em questão, infantilzinho até, começa citando efeitos adversos, distúrbios que pressupõem à Cloroquina, mas que no fim esclarece ser da Novalgina...

Quanta bobagem!!!

O pior é que esquecem que, até então, bradavam que a Cloroquina era vendida sem prescrição, sem receita, livremente, em qualquer farmácia e que, por isto (!!!), não era nada perigosa, que havia exagero e “hipocrisia”...

Mas eu – pessoalmente – disse isso a dezenas de pessoas: que não é porque era comercializada livremente, que não causa danos. Temos muitos exemplos para isto, dentro e fora da farmacêutica. A Água Sanitária é neurotóxica e praticamente todos a tem em casa... Um simples “remedinho” para azia ou refluxo gástrico, vendido e usado livremente, pode causar danos renais graves (é o que diz um artigo no “Journal of the American Society of Nephrology”)... e droga é droga... todas, sem exceção, causam algum dano, em menor ou maior grau.

E, por fim, essa banalidade, essa afetuosidade doentia por uma droga, nem vem ao caso... a questão é: "confirmação científica"... funciona realmente?

Se você não sabe, vou trazer-lhe uma informação bastante relevante: Por volta de 2015, a Cloroquina foi proposta como uma solução aos casos de microcefalia, causados pelo Zika Vírus... funcionou maravilhosamente bem "in vitro"... em testes de laboratório!!! ... e foi só... passaram-se cinco anos (5!!!), e, até que eu saiba... nada! Nada de definitivo!

Eu sei, Zika é Zika, Corona é Corona... mas a questão é: De novo!?!? Novamente vamos morrer no "in vitro", nas promessas, na esperança? As reações metabólicas, importantes para a ação positiva contra o agente, são muito complexas e podem "inativar" a ação esperada...

Sei que estão todos esperançosos, mas há muitas informações desencontradas, muita “Fake News”. É Cloroquina, Ivermectina... o que mais ? Afinal, essa coisa é vírus ou um berne? Desculpe a piada, mas está muito ridículo esta situação de “torcida fervorosa” para com um medicamento. São, todos, parasiticidas... e o vírus cumpre um ciclo muito mais complexo; não é a mesma coisa! Pode, um dia, haver confirmação de que algum desses princípios funcione? Pode! Mas não é o que temos, até então... o que temos são esperanças... e o que vemos é pura politicagem. E a política não pode, de forma alguma, atropelar a ciência.

O Laboratório Químico Farmacêutico do Exército Brasileiro (detentor do registro da Cloroquina 150 mg, na ANVISA) produzia cerca de 125 mil comprimidos da droga, por ano... Agora – sob ordem presidencial – apoiado pelos Laboratórios Farmacêuticos da Marinha e da Aeronáutica, passou a produzir 1 milhão de unidades por semana (isto equivale a uma produção de 48 milhões ao ano, uma produção 384 vezes maior).

Ah, certo... agora vamos ter que consumir as toneladas que o presidente ordenou ao exército que produzisse, porque vencem em 2022 e é centenas de vezes maior que o habitualmente consumido no país... Ah, já ia esquecendo: e tem também os dois laboratórios – “apoiadores” do governo – que também abasteceram seus estoques de matéria-prima sob "promessa" de consumo... será que é possível entender?

Enfim... Cloroquina é só um reflexo do fanatismo político... infelizmente, até o momento... só...


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3 comentários:

  1. Certo... mas a cloroquina é uma molécula sintética e, na verdade, apesar da sugestibilidade de nomenclatura, enquanto molécula, nada tem a ver com o quinino ou quina... Esta é um alcaloide natural, de molécula absurdamente diferente da Cloroquina ou Hidroxicloroquina.
    Não soube que havia estado sob o risco do corona. Os alcaloides, como é o caso do quinino, são substância que naturalmente, na planta, agem como mecanismo de defesa, e podem agir beneficamente no organismo animal, porém alguns também podem causar danos, mesmo que imperceptíveis.

    Em relação às correntes científicas, concordo... eu, por exemplo sou adepto da Nutracêutica, e raramente ingiro alguma droga química/sintética...

    Quanto ao tempo de uso da Cloroquina, são, na verdade, 75 anos (desde 1945) e, se ler com atenção, no texto diz que em cerca de 10 anos, já começaram os problemas de resistência do agente causador da malária (Plasmodium)frente a droga, momento em que também começaram a surgir as percepções de seus efeitos adversos, muitos de caráter severo e irreversível.

    Ser usado por/em grávidas, crianças, convalescentes, imunodeprimidos ou qualquer outro caso de condição especial, não é atestado de segurança total e não significa - absolutamente - que não possa causar danos... Aliás, quantas funções metabólicas, quantos mecanismos de ações bioquímicas, quantas associações de substâncias e outros fatores microbiológicos, moleculares, genômicos, até "energéticos" são ainda desconhecidos no corpo humano? Não se sabe sequer, ao certo, como se dá a absorção da Vit B6, a Piridoxina! Da mesma forma, não se pode alegar que algo é seguro porque alguns a ingerem por determinado tempo... quem garante que não está fazendo algum mal? Um bom exemplo é o DDT que, durante a segunda guerra, era usado por soldados que passavam-no na pele para combater piolhos e outros parasitas. Hoje, sabemos que o DDT é altamente cancerígeno, causa alterações severas no Sistema Nervoso Central e graves lesões hepáticas e renais... no entanto, foi usado por décadas! Pra variar (vamos aproveitar a deixa kkk) foi banido em vários países por volta de 1970, mas, no Brasil, somente em 2009.

    Em relação às psicoses, concordo que uma guerra pode causar sérios danos psíquicos por si só, mas, pelo descrito, nunca foi tão grave, tanto que rendeu um processo coletivo histórico e alarmante.

    Agradeço pelos elogios e, muito mais, por ler os artigos e prestigiar o blog e, principalmente pelo comentário... isso, realmente, é muito importante...

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  2. Eita... li o artigo e li tb vários comentários... e me desculpem, vcs esqueceram de deixar bem claro uma coisa, o tratamento se dá só por 5 dias,e a dosagem é 5mg... Então me perdoa, mas todos esses contextos caem por terra... obrigado

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  3. Ok...Mas 5mg? Sério? Desculpe, eu devo ter entendido errado em minhas pesquisas... Artigos Científicos usam de terminologias muito técnicas e, apesar de veterinário, posso ter cometido algum equivoco na interpretação...
    Vejo que é esta sua área... Não é a minha, sendo assim, deixarei um link, (pois fui rever os dados... não sei, mas acho que deveria ler), assim poderá ao menos atualizar-se em sua especialidade, pois vejo que está equivocado em relação à dosagem preconizada pelo Ministério da Saúde...
    Mas, por fim, sequer vem ao caso... o foco do texto contextualiza as discussões acerca dos motivos pela insistência do uso desta droga... mas, agradeço pelo comentário... de certa forma, tudo vem acrescentar...
    ... segue o link:

    https://www.sanarmed.com/uso-da-cloroquina-no-tratamento-da-covid-19

    ...

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